É quase impossível não sorrir ao ver a foto da cadelinha Laika em pose de astronauta dentro da cabine que orbitaria o nosso planeta – mas a fofura que a imagem desperta não condiz com o triste desfecho já previsto na realidade
Em 3 de novembro de 1957, aos três anos de idade, a cadelinha Laika embarcou para uma viagem sem volta. Resgatada – talvez, o termo mais correto seja capturada – das ruas de Moscou, na Rússia, a vira-lata de temperamento dócil e calmo era considerada a tripulante perfeita para a missão Sputnik II do programa espacial russo: seu porte era adequado ao tamanho da cabine; os sensores usados na operação aderiam facilmente ao seu pelo liso e curto; e sua saúde era mais resistente que a dos cães com pedigree. Como ainda não existia nenhum tipo de tecnologia para trazer satélites em segurança de volta à Terra, todos sabiam que, uma vez a bordo, Laika não voltaria para casa.
A cabine da cadelinha na Sputnik II era pressurizada, acolchoada e com espaço suficiente para que ela deitasse ou ficasse de pé ainda que presa por uma guia. Comida e água eram oferecidas em forma gelatinosa, e um coletor de dejetos foi incorporado a ela. O plano era que, depois de observar e testar como Laika se comportaria no espaço, uma porção de ração envenenada seria liberada para ela, que, segundo os cientistas, morreria de maneira indolor e sem sofrimento.
Era a versão em que se acreditava até 2002, quando veio à público a verdadeira causa da morte de Laika: o estresse provocado pelo superaquecimento da cabine ao entrar em órbita.
Por muito tempo, ela foi reconhecida como o primeiro mamífero a ultrapassar os limites do planeta. Mas outros animais já tinham sido usados como cobaias espaciais. Em junho de 1949, um macaco batizado de Albert II atingiu 134 km de altitude antes de morrer por conta de impactos na aeronave em que viajava. Seu antecessor, Albert I, também um macaco, faleceu ainda no lançamento do foguete V-2. Os sucessores da mesma espécie, Albert III e IV, também morreram durante os lançamentos de seus foguetes.
Sem esquecer nem desmerecer o sofrimento dos demais animais, o de Laika foi emblemático. Depois da descoberta sobre o que realmente tinha acontecido com ela na missão espacial, a comunidade científica passou a questionar com mais intensidade se os sacrifícios dessas espécies justificavam os avanços tecnológicos. Especificamente no caso de Laika, alguns cientistas que atuaram diretamente no projeto da Sputnik II defendem que o sacrifício dela não promoveu nenhuma alteração relevante nos estudos espaciais realizados lançamento do satélite.
Desde então, cientistas e ativistas debatem e trabalham sobre o papel dos animais em testes científicos – sejam eles tecnológicos ou laboratoriais.
Vocês podem me perguntar: mas, Carol, se não fosse a Laika, muitos humanos poderiam ter morrido em testes e mais testes. Mas, pense comigo: nós, humanos, ao embarcarmos em uma missão desse tipo, somos informados e partimos conscientes do que pode dar errado, é uma escolha nossa; no caso dos animais, não. Ter o poder de decidir enfrentar o risco é o que diferencia a tragédia da crueldade.
Com informações e imagens de TecMundo e CanalTech.
Publicação original na coluna de Carol Zerbato no Blog Petiko.